Psicodélicos: estudo questiona psilocibina para depressão – 21/08/2025 – Virada Psicodélica
Efeito placebo muita gente conhece, não tanto o nocebo. Um estudo escandinavo lança suspeita explosiva de que o fenômeno paradoxal esteja na origem do aparente benefício antidepressivo pronunciado da psilocibina, substância presente em cogumelos que está na vanguarda da pesquisa clínica para depressão.
O artigo no periódico Jama Network Open sobre o psicodélico é uma meta-análise, reunião dos dados de várias pesquisas capaz de fortalecer –ou minar– a confiança num determinado tratamento. No caso, médicos da Suécia e da Dinamarca levantaram 17 ensaios controlados por placebo, totalizando 4.960 pacientes.
No grupo de controle, o voluntário recebe substância inócua (placebo) em lugar do medicamento em teste, ou uma dose insignificante dele. Depois se quantifica, com questionários padronizados, a melhora em cada braço do estudo, e a diferença entre eles vale como medida do impacto terapêutico específico da droga, uma vez que se descontou o efeito placebo.
Esse artifício se tornou o padrão ouro da pesquisa clínica porque todo mundo melhora um pouco nesse tipo de estudo, até quem caiu no grupo placebo. Ocorre uma diminuição espontânea de sintomas, pois a simples expectativa de ser tratada leva a pessoa a se sentir melhor. Mas o truque só funciona se o participante acreditar que pode ter recebido o composto ativo.
Fredrik Hieronymus, Evana López, Helena Sjögren e Johan Lundberg investigaram como se diferenciam os grupos experimental e de controle nos estudos com psilocibina, escetamina (como o spray nasal Spravato) e antidepressivos usuais como escitalopram (inibidores seletivos de recaptação de serotonina, ISRS). E a comparação deu problema.
A diferença no efeito era muito maior no caso da psilocibina, criando a aparência de benefício antidepressivo bem mais acentuado. No detalhe, contudo, constatou-se que a distância entre um contingente e outro aumentava porque no grupo de controle da psilocibina havia melhora muito menor que nos estudos com os outros dois compostos.
No caso da escetamina, o efeito placebo garantiu uma melhora no grupo de controle 23 pontos percentuais maior que no estudo da psilocibina. Com antidepressivos da classe ISRS, a diferença foi de 14 pontos.
A explicação mais plausível decorre de a psilocibina ser um psicodélico, ou seja, induzir experiência subjetiva profunda, uma alteração da consciência conhecida como “viagem”. Para quem cai no grupo de controle, fica óbvio que tomou um placebo e não a psilocibina, e a pessoa se decepciona, se desanima.
É o efeito nocebo em ação, aponta o estudo escandinavo. Ou seja, a expectativa se torna negativa, o que pode não só inibir aquela melhora espontânea de sintomas como até agravá-los.
A maior contribuição do estudo escandinavo está em deitar um tanto de água fria no entusiasmo com a psilocibina, o psicodélico mais avançado (estudos de fase 3) para tratar depressão. Mas há dois problemas nele.
Primeiro, a pequena a quantidade de pacientes (373) nos testes clínicos com psilocibina arrolados na meta-análise, contra 4.014 nos de ISRS. As discrepâncias poderão ou não se manter quando a incipiente pesquisa com psicodélicos avançar.
Outra questão: a meta-análise põe em dúvida a diferença entre grupos de placebo e de tratamento, que no caso da psilocibina parece conter um artefato, mas não invalida que no segundo contingente houve de fato melhora. E melhora imediata, o que pode fazer dela uma alternativa bem-vinda para um terço ou mais de portadores da depressão resistente a tratamentos como os ISRS.
Os céticos enclausurados no paradigma farmacológico poderão sempre alegar que se trata só de efeito placebo, e não virtude do psicodélico. Já os céticos com esse paradigma poderão contra-argumentar que o próprio nocebo é artefato do método duplamente cego, a desqualificar o poder de uma inteligência interna de cura.
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